domingo, setembro 10, 2023

Sobre encarar.


Agora entendia de onde vinha a dor. A carta meio amassada em cima da cama falava pouco, mas o bastante para que tanto fosse explicado. 
Os sumiços, o aparente desinteresse pela filha, as noites sem sexo que as levou a supor traição - tudo agora se encaixava e mais, fazia com que se perguntasse como poderia ter sido tão cega diante de alguém que ela tanto amava. 

Por algum motivo que Ana não entendia, Theo escolhera esconder sua dor; talvez para protege-la ou poupá-la do trabalho de precisar lidar com algo além da maternidade que logo a aguardava. 

Ele sentia uma dor visceral, como se tivesse algo muito profundo preso dentro de si, implorando para ser acessado, mas que agora ocupava uma parte muito grande de si para voltar atrás; como doía. 

Nas pequenas trocas do dia a dia agora em retrospectiva ela conseguia ver Theo se afastando, deixando de corresponder do jeito que um relacionamento pede. Ao mesmo tempo, suas reações frente a esse movimento praticamente não existiam. Via e deixava ir, sem lutar ou mesmo tentar acolher aquele contexto tão triste. 

Doía, mas não era apenas pela carta que finalmente validava o tanto que faltou resgatar. Era por saber que ela também tinha desistido muito antes daquele dia; porque no fundo, sabia que não era com ele que ela queria trazer sua filha ao mundo. Em que momento isso mudou? 

O que importava é que agora conseguia respirar. Doía, mas a angústia aos poucos dissipava a ansiedade do não saber, de não entender o que Theo pensava ou o que ela de fato precisava.