Suco de Laranja

"Diz pra mim se vale a pena, amor
A gente ria tanto desses nossos desencontros
Mas você passou do ponto e agora eu já não sei mais..."


  Finjo que não te vejo porque não quero ter que agir como tonta caso tivesse que lidar com você. Porque eu perco o chão, as palavras, a postura.

  Eu finjo não te ver e passo reto porque quero o gostinho de ter você me puxando pelo braço, buscando qualquer abraço reprimido meu. Porque ele cresce quando te encontro, quando te encosto em mim e você me encosta em você. Nossos corpos se tocam com delicadeza porém franqueza, como quem sabe o que irá encontrar.

  Hoje te vi do outro lado da rua e não corri. Simplesmente continuei minha rota torta em direção ao carro, como quem não quer nada, como quem não viu nada, especialmente você. Admito ter dado passos longos e calmos, sem muita pressa, pra dar tempo de você me ver e me querer, pra dar tempo de, quem sabe, você caminhar atrás de mim e pedir pra entrar no carro comigo, assim, como quem não quer nada.

   Mas você não veio... E os passos foram se tornando grandes demais para a minha ansiedade, pesados demais para o meu coração. Fui cansando aos poucos, me frustrando rápido demais, sem medir qualquer consequência, sem ponderar que talvez, você tivesse certeza de que eu tivesse te visto primeiro.    E vi. Me viu.
  E foi por justamente saber que eu tinha te visto, que você sorriu. Do outro lado da rua, você sorriu assim que virei contra minha vontade e fui em direção ao carro. Por um segundo, senti você tentando atravessar, ensaiando para me alcançar e dizer que aceitava a derrota, que eu tinha ganho, que você era o gato e eu o rato. Mas depois também senti você ali, brincando de algo a mais. Senti você brincando com os meus sentimentos, com as nossas memórias, os nossos planos. 
  Vi você segurando um molho de chaves e um copo de suco de laranja e, por um segundo, pensei ter visto quando seus lábios se moveram mudos enquanto diziam “pare de fingir”.

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